Pequena História de Um Herói

O nome dele é Seu Lino. Nascido em Upatininga, um distrito de Aliança/PE, em meados da década de 40, residindo lá até hoje. Sua maior identidade é sua lembrança. Lembra como se fosse hoje dos tempos em que precisava ir "pro eito da cana", e de fato está muito recente em sua memória, faz pouquíssimos anos que aposentara-se. Lembra-se dos conselhos de seu sogro o ensinando a arte de ludibriar o "senhor de engenho".

- Lino, não seja besta, faça como eu, cuide de sua terra e de sua família. Não fique se matando pra ninguém. Eu mesmo, as vezes, quando preciso trabalhar meu roçado pela manhã vou trabalhar só depois de "mei-dia" e digo ao patrão que minha mulher estava doente e tive que ir lá em aliança comprar remédio pra ela e por isso cheguei tarde no trabalho.

Torna-se necessário ressaltar que há alguns anos haviam muitos "moradores de engenho", em comparação com o tempo presente, boa parte desfrutava de um sítio onde podiam plantar e, levando em conta que o salário era irrisório, os alimentos ali plantados serviam para suprir uma pequena parte das necessidades dos moradores. Estes ainda recebiam menos que os trabalhadores que, mesmo sendo cortadores de cana, moravam nas pequenas cidades, isso porque era descontado no salário dos moradores de engenho uma espécie de foro pelo uso das terras cedidas pelo engenho para subsistência.

Pois bem. Foi assim que Seu Lino foi sentindo a vida, no reflexo de seu corpo. O corpo de um homem do campo reflete, talvez mais do que qualquer outro, as agruras da vida. A felicidade, segundo Freud, é buscada por todos os homens, mas no caso de Seu Lino talvez ele apenas tente sobreviver, isso mesmo! sem necessariamente buscar algo além disso. Raramente alguém o encontra rindo, teria ele motivos pra rir? Podemos ainda argumentar que essa seriedade é natural do homem do campo, talvez o seja. O fato é que torna-se difícil esperar momentos de alegrias vindo de uma pessoa que passou a vida sofrendo. 

Seu Lino é um herói, criou três filhas, sendo uma adotada, e cinco filhos, sendo um adotado também. O leitor pode dizer: "nossa! ele teve muitos filhos". Mas há alguns anos era natural, tanto no campo como na cidade, o número de membros das famílias serem numerosos. Pode ter faltado demonstração de amor, não confunda o leitor com falta de amor, na criação de todos esses filhos, o homem do campo é muito frio quando a questão é demonstrar carinho e afeto por sua família, mas para Seu Lino a maior virtude de um homem é a honestidade e isso ele ensinou a todos os filhos. O leitor deve está se perguntando onde a esposa de Seu Lino entra nessa história, mas isso é assunto para uma conversa futura, dada a importância dessa mulher do campo na sobrevivência juntamente com seu esposo e filhos.

Por essas e outras coisas, Seu Lino é um herói que representa tanto os trabalhadores pobres do campo como os da cidade. Se aposentar como trabalhador do campo não é fácil, só quem já trabalhou cortando cana e trabalhando a terra com técnicas rudimentares sabe o quão penoso é. 

Infelizmente não da para contar tudo, mas espero ter incitado o leitor a se interessar um pouco mais sobre o homem do campo e valorizar o trabalho realizado pelo mesmo, afinal, muito do que é produzido por eles chega em nossos lares para nossa alimentação, um desses torna-se indispensável em nossas cozinhas, o açúcar.  

Adriano Martins